Claudinei Zagui Pareschi
Docente SEESP–Limeira-SP/Brasil
Luzia Batista de Oliveira Silva
Docente PPGE-UNIMEP–Piracicaba–SP/Brasil
Resumo
Este estudo objetivou investigar a indústria cultural e a sua influência na formação do sujeito na sociedade e na escola. A indústria cultural investiuem tecnologias para oferecer ao homem diversão e entretenimento em seu tempo livre. Ao se submeter a essa realidade alienante e adestradora, o indivíduo perde algumas possibilidades de ter experiências formativas. Entretanto, as tecnologias digitais construídas no contexto da sociedade de consumo, quando transpostas para as experiências culturais e formativas, carregam consigo ambiguidades, e tanto podem estar a serviço da dominação como da emancipação dos indivíduos. Analisam-se as influências das novas tecnologias na vida do homem hodierno, particularmente, nas experiências formativas de educação.
Palavras-chave: novas tecnologias, experiências formativas, consciência critica
INTRODUÇÃO
Os filósofos frankfurtianos presenciaram os avanços tecnológicos de suas épocas e os impactos destes na formação humana e crítica das pessoas, por isso, criticaram o capitalismo e os meios de comunicação de massa, por considerá-los meios de dominação e obtenção de lucro. Aambiguidade na tecnologia precisa ser analisada porque ela pode ser utilizada tanto a serviço da emancipação do indivíduo como a serviço da sua dominação. As exigências do mundo contemporâneo atordoam os jovens que precisam se preparar para o mercado de trabalho, dado que, precisam dominá-las, e, com isso, transformar até as maneiras de aprender e de ensinar, trazendo aos educadores novas possibilidades e novos desafios. Como fruto do desenvolvimento da técnica e da razão instrumental, a tecnologia passa a ser um instrumento eficaz nas mãos daqueles que querem fazer da educação um bem de consumo e de dominação, preparando os alunos somente para o mercado de trabalho. Então, é relevante repensar a educação atual baseada nos valores e nos princípios pautados pelos filósofos frankfurtianos, para criar temas e estratégias de ensino que incentivem a reflexão crítica, necessária para o exercício da cidadania.
Para Adorno e Horkheimer (2006), a técnica e a tecnologia sempre estiveram atreladas aos meios de dominação. Ainda que prometessem libertar o homem do medo e do trabalho árduo e acabar com a miséria no mundo, isso jamais aconteceu porque a técnica instrumentalizou a razão, reificou os indivíduos e logrou-os em seu tempo livre com produtos culturais descartáveis. A adaptação à realidade se sobrepõe à construção de autonomia e emancipação.
A fetichização da técnica gerou pessoas obedientes às suas instruções e tutelas. Para Marcuse (1999) essa nova realidade se respalda numa racionalidade tecnológica, sendo capaz de despir os homens de sua individualidade e autonomia.
A indústria cultural, lucrativa, investiu na tecnologia para oferecer ao homem diversão e entretenimento em tempo livre. Ao se submeter a essa realidade alienante e adestradora, o indivíduo dificilmente terá experiências formativas. Na escola é perceptível como os alunos estão imersos na cibercultura, consumindo sempre produtos tecnológicos da indústria cultural; aparatos estes que enquadram os jovens estudantes em seus padrões. Portanto, consideramos relevante refletir sobre esse tema da tecnologia e da formação.
TÉCNICA E TECNOLOGIA
Adorno e Horkheimer (2006) analisaram o desenvolvimento do Esclarecimento da sociedade ocidental desde os seus primórdios até o ápice do Iluminismo, criticaram a razão instrumental, a civilização técnica e a lógica cultural do sistema capitalista pela criação de uma sociedade de mercado baseada no progresso técnico. Essa obra analisa os erros violentos cometidos na Segunda Guerra Mundial, os quais levaram a humanidade a um estado de barbárie.
Os filósofos almejavam chegar à gênese da ratio tecnificada, para mostrar que o desenvolvimento da modernidade foi marcado por um processo permanente de instrumentalização da razão; tais análises podem nos ajudar a pensar os desafios postos à formação cultural gerada pelos aparatos tecnológicos, cada vez mais sofisticados e marcantes na sociedade atual e na educação, cuja técnica é representada por novas tecnologias e promessas otimistas almejando possíveis benefícios para a sociedade e para a educação.
O Esclarecimento (Aufklarung), para Adorno e Horkheimer (2006:17), é uma exigência para a “maioridade intelectual”, para a formação da consciência crítica e da autodeterminação livre do sujeito, objetivando por isso, “livrar os homens do medo e investi-los na posição de senhores”, proporcionando o “desencantamento do mundo”, dissolvendo mitos e substituindo a imaginação pelo saber. O esclarecimento libertou o homem do dogmatismo religioso e da submissão perante a natureza, criando uma racionalidade científica iluminista, na qual, a razão é soberana e o conhecimento científico conduziria a civilização ao progresso, à emancipação.
Adorno e Horkheimer reconhecem que o progresso tem renovado a dominação: “O desenvolvimento da técnica poderia proporcionar ao homem trabalhar menos, viver melhor e ter mais tempo para se dedicar à cultura, mas não era isso o que acontecia” (PUCCI, 2006: 86). Numa sociedade administrada pelos capitalistas, a existência humana é moldada para adaptar-se a um sistema que privilegia a mercadoria e o lucro em detrimento de sua subjetividade, isto é, da própria existência humana.
Para Adorno e Horkheimer (2006:33), a instrumentalização da razão pela ciência tornou os indivíduos menos reflexivos porque “o pensar reifica-se num processo automático e autônomo, emulando a máquina que ele próprio produz para que ela possa finalmente substituí-lo”. A tecnologia, antes representada pelas máquinas, foi denunciada como resultado da razão instrumental. Administrados pela racionalidade tecnológica, os indivíduos perdem suas autonomias, ficando cada vez mais vulneráveis às exigências do mercado.
Os aparatos tecnológicos que medeiam a educação não deixam de possuir a mesma racionalidade técnica que, de acordo com a visão dos autores (2006), sempre estiveram atrelados ao progresso, ao poder e ao capital. O processo de desenvolvimento da tecnologia está ligado, intimamente, aos interesses daqueles que detêm os bens de produção e o controle socioeconômico na sociedade, beneficiando, por isso, o sistema capitalista.
Para Marcuse (1999:73), a tecnologia, como a totalidade dos instrumentos que caracterizam a era da máquina, “é ao mesmo tempo uma forma de organizar e perpetuar as relações sociais”, manifestando o pensamento e padrões do comportamento dominante, ou seja, “um instrumento de controle e dominação”.
Essa particularidade da tecnologia afeta os indivíduos na medida em que estes passam a usá-la, mecanicamente, e sem limites, passando por cima dos valores e afetando a racionalidade daqueles a quem servem. “O homem médio dificilmente se importa com outro ser vivo com a mesma intensidade e persistência que demonstra por seu automóvel”. (MARCUSE, 1999:81).
Os filósofos alertavam para a ambiguidade da tecnologia desde a sua constituição; fora aperfeiçoada em vista de um progresso no domínio da natureza pelo homem e também de um domínio do homem pelo próprio homem, tendo em si, tanto uma dimensão de autonomia como de adaptação: “A técnica, por si, tanto pode promover o autoritarismo como a liberdade, a escassez como a abundância, o aumento do trabalho árduo como sua abolição”. (PUCCI, 2006:78).
A tecnologia, como resultado do desenvolvimento da técnica, a partir do capitalismo tardio, trouxe benefícios e também malefícios. O que prevalece é a dimensão de adaptação e de dominação do homem sobre o homem e sobre a natureza. Nesse sentido, para Adorno e Horkheirmer e Marcuse (2006; 1999), a tecnologia organiza e perpetua as relações sociais, padroniza os comportamentos e se torna instrumento de controle e dominação.
Os indivíduos, para sobreviverem, adaptam-se aos ditames das máquinas, sendo despidos de sua individualidade pela racionalidade sob a qual vivem: “Esta racionalidade estabelece padrões de julgamento e fomenta atitudes que predispõem os homens a aceitar e introjetar os ditames do aparato” (MARCUSE, 1999:77); os indivíduos perdem com isso sua autonomia e capacidade crítica.
O homem coisifica-se, se vê dependente das novas tecnologias que prejudicam sua formação (Bildung), assim, subjugado: “Ao manipular a máquina, o homem aprende que a obediência às instruções é o único meio de obter resultados desejados. Ser bem-sucedido é o mesmo que se adaptar ao aparato. Não há lugar para a autonomia”. (MARCUSE, 1999:80). O indivíduo “mudou sua função: de uma unidade de resistência e autonomia, passou para outra de maleabilidade e adaptação” (p.91).
Para neutralizar os efeitos regressivos causados pela tecnologização, deve-se usar grande parte do potencial tecnológico a serviço da emancipação, facilitando o desenvolvimento humano nos ramos do trabalho e da educação, criando novas formas de individualização, preparando o sujeito para o enfrentamento da realidade, com autonomia e consciência crítica. A tecnologia deve, nesse sentido, ser utilizada como um meio e nunca como um fim.
Na atualidade, a tecnologia avança com força e rapidez, numa proporção impensável pelos filósofos frankfurtianos; abrange parte considerável da sociedade, estando presente nos lares e nas tradicionais instituições, como as escolas. Sendo, portanto, fundamental fazer a crítica à tecnologia atual, amparada pela crítica dos frankfurtianos.
A INDÚSTRIA CULTURAL
Para entender o pensamento de Adorno e Horkheimer sobre a educação, é fundamental explorar o conceito de Indústria Cultural como um instrumento de dominação e domesticação das massas, causando a reificação do indivíduo. Criados e utilizados por Adorno e Horkheimer em suas obras, os conceitos “indústria cultural” e “semiformação cultural” são relevantes em nossa análise da tecnologia e educação.
Adorno e Horkheimer (2006) utilizaram, pela primeira vez, o conceito de “indústria cultural” como resultado de um processo de popularização da cultura dominante burguesa, proporcionada pela sociedade industrial e divulgada nos meios de comunicação de massa.
A arte consumida pelas massas, como mercadoria, serve como um instrumento de dominação social e de reificação da consciência. A indústria cultural, com todos os seus aparatos e peripécias, anuncia falsas promessas de sucesso e satisfação, almejando apenas o lucro. Para os autores (2006:118), “o logro, pois, não está em que a indústria cultural proponha diversões, mas no fato de que ela estraga o prazer com o envolvimento de seu tino comercial nos clichês ideológicos da cultura em vias de se liquidar a si mesma”.
A indústria cultural utiliza-se da técnica para criar produtos e envolver o consumidor em seus discursos vazios e alienantes, onipresentes na sociedade e na ordem econômica capitalista. Assim, transformada pela técnica, a arte chega às massas descaracterizadas de criticidade. O sujeito se torna consumidor e gerador de lucro, sem autonomia.
Para ser vendida como uma mercadoria, a arte foi padronizada pela indústria cultural e deixou de ser uma crítica à ordem social, para fazer parte de um imenso mecanismo que visa produzir um clima conformista e dócil na multidão passiva. A padronização da arte e sua produção em série permitiram a difusão da cultura para um amplo setor da sociedade civil; prejudicaram, porém, sua autenticidade e sua autonomia.
Adorno e Horkheimer (2006) perceberam que a técnica, empregada no âmbito da indústria cultural, torna o homem mais ignorante, não passando de uma arma de dominação nas mãos dos capitalistas que ditam, para a sociedade, os modelos culturais a serem adotados por elas. O rádio e a televisão, como meios de comunicação de massa, já bastante difundidos na época, eram usados pelos capitalistas e pelos governantes para difundir o que deveria ser consumido, como cultura, pelas massas. Esse processo de monopolização de bens culturais e de imposição de culturas mercadológicas, através dos meios de comunicação de massa, é resultado de uma regressão do Esclarecimento à ideologia da indústria cultural: “O cinema e o rádio não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passam de um negócio, eles a utilizam como uma ideologia destinada a legitimar o lixo que propositalmente produzem”. (ADORNO; HORKHEIMER, 2006:100).
A monopolização dos bens culturais e sua produção em série facilitaram o acesso da população aos produtos, valorizando o ócio e o lazer. Entretanto, do jeito que o homem consome esses produtos, de maneira acrítica e irrefletida, empobrece sua cultura e fortalece a dominação, a manipulação e o controle social. A ideologia da classe dominante disseminada pelos meios de comunicação de massa domestica o homem que, fatigado pelas longas jornadas de trabalho, procura novos meios de informação, de cultura e lazer. Encontra tudo isso muito fácil nas rádios, nos canais de TV e, hoje, na internet.
A indústria cultural repudia qualquer tipo de reflexão, investindo em diversão e entretenimento, pois “A diversão é o prolongamento do trabalho sob o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem quer escapar do processo de trabalho mecanizado, para se por de novo em condições de enfrentá-lo” (ADORNO; HORKHEIMER, 2006:113), Entretanto, “ao mesmo tempo, a mecanização atingiu tal poderio sobre a pessoa em seu lazer e sobre a sua felicidade” (p.113), que até “determina tão profundamente a fabricação das mercadorias destinadas à diversão que esta pessoa não pode mais perceber outra coisa senão as cópias que reproduzem o próprio processo de trabalho”. (p.113).
Para os autores (2006:112), quando a cultura está sob o poder do monopólio, ela se torna mecânica e não passa de um negócio para vender o que é produzido pela indústria cultural, e “seu controle sobre os consumidores é mediado pela diversão”. Por isso, o rádio, a televisão e a Internet tornaram-se ferramentas importantes para a difusão da ideologia da classe dominante. Na sociedade de consumo, a arte está perdendo seu caráter estético, ficando destituída de sentido e vazia, se rebaixando a mera cópia de algo que é ou que foi importante para a sociedade.
As tecnologias, aliadas à indústria cultural, colocam nos indivíduos comportamentos estereotipados, conduzindo-os à massificação, caminhando num sentido oposto ao da transformação social como meio de emancipação. Levam o indivíduo a um estágio pré-reflexivo, não racional e não espiritual, causando uma espécie de dependência.
Quando o homem se submete à lógica ilusória da indústria cultural, ele perde a experiência (Erfahrung), ou seja, a base para a constituição de sua subjetividade, impedindo todo o processo formativo. Sem tempo para refletir, para estudar, o homem trabalha cada vez mais para poder adquirir, de maneira desregrada, os bens de consumo. Os indivíduos são modelados de acordo com os parâmetros impostos pelos meios de comunicação de massa e, massificados, perdem a consciência da realidade e a autonomia e não percebem que estão sendo explorados, que a cultura que estão consumindo é precária. Não imaginam que estão sendo presas fáceis nas mãos de falsos líderes a quem procuram imitar e, manipulados, começam a agir sem vontade própria e irracionalmente.
Eis o duplo caráter da cultura: ao mesmo tempo, busca a autonomia do sujeito e a sua adaptação à vida real. Para se tornar um sujeito autônomo e emancipado, o indivíduo precisa ser livre para fazer uso de sua razão, pensando sobre os aspectos que envolvem a sua formação, para que, assim, possa se esclarecer. Entretanto, a indústria cultural integra os indivíduos ao todo da sociedade, a fim de controlá-los para que possam colaborar com a manutenção do capital, garantindo sua submissão consentida e seu adestramento à lógica da sociedade tecnológica, trazendo uniformização, diminuindo, portanto, a diversidade.
Em síntese, Adorno e Horkheimer (2006) revelam como os meios de produção e difusão da cultura atual se vinculam aos interesses mercadológicos. A partir dessas críticas, podemos pensar a presença das novas tecnologias no campo escolar e na formação de professores. A tecnologia carrega em seu bojo uma intencionalidade de precisão e uma funcionalidade que podem gerar e reforçar o conformismo, a frieza, a massificação e a dependência. Sua ambiguidade faz pensar em seu uso na educação como recurso para alcançar uma autonomia ou apenas uma adaptação à realidade, impossibilitando os indivíduos de realizarem experiências formativas, impedindo-os de chegarem à emancipação.
Uma formação emancipatória só ocorre, de fato, se a tensão entre a dimensão adaptativa e a transformadora for preservada. É preciso conduzir os indivíduos para a consciência crítica, para a resistência e para o inconformismo com a realidade, e não, simplesmente, submetê-los aos interesses do mercado. Esse aspecto deve ser levado em consideração quando o assunto a ser analisado envolve tecnologia e educação.
OS DESAFIOS DO AMBIENTE ESCOLAR PARA A FORMAÇÃO (BILDUNG)
Adequando-se a escola ao capitalismo tardio, nutrindo-se da racionalidade instrumental, ela pode reproduzir uma realidade alienante e adestradora de comportamentos impostos pela indústria cultural. Nessa perspectiva, a educação perde as suas funções emancipadora e formativa dos indivíduos – o que lhes daria condições para enfrentar e resolver problemas da sociedade em que vivem – para torná-los aptos aos valores de mercado e resolver os problemas da sociedade tecnológica e capitalista.
No cotidiano escolar, percebe-se que as crianças e adolescentes são devorados pelo “princípio de adaptação” gerado pela indústria cultural e divulgado pelos meios de comunicação de massas. Amparados pelos pais, eles também se tornam grandes consumidores dos produtos culturais e de outros bens. Logrados pela indústria cultural, encaixam-se em seus padrões. Por exemplo, quando um professor propõe uma atividade cultural envolvendo músicas que fogem do padrão mercadológico, eles rejeitam e impõem resistência, prejudicando a atividade e fazendo com que os professores se desdobrem para alcançar seu objetivo.
Os celulares e outros aparelhos eletrônicos das mais diversas funções também estão presentes na sala de aula, mesmo sendo proibidos. São, hoje, os motivos de terror dos professores, que precisam disputar, com eles, a atenção, e, muitas vezes, não conseguem, pois são usados de diversas formas, como um minicomputador que recebe e manda mensagens via torpedos, filma, fotografa, reproduz jogos, músicas e vídeos manejados pela indústria cultural. Tornaram-se jovens consumistas, fruto do capitalismo e da indústria cultural.
As características dessa geração tecnológica devem ser levadas em consideração ao se pensar em estratégias que possam facilitar a formação (Bildung). Toda essa tecnologia na qual os alunos estão envolvidos pode ser usada a favor da educação. A tecnologia facilita a transmissão de conhecimentos, o compartilhamento de arquivos, músicas, fotos, filmes, potencializando a comunicação e ajudando a difundir a cultura. Nesse sentido, os alunos precisam adquirir habilidades que permitam o controle da tecnologia e seus efeitos, pois os aparatos tecnológicos se tornam empecilhos para formação na medida em que submetem os indivíduos às diversas formas de dominação, não colaborando, portanto, para a sua emancipação. Adorno critica a sociedade tecnológica que treina os indivíduos afinados com a tecnologia em perfeita consonância com o mercado de trabalho.
Com a universalização da indústria cultural e a contradição entre formação cultural e sociedade de consumo, cria-se a semiformação (Halbbildung). Para Leo Maar (2003:467): “a semiformação seria a forma social da subjetividade, determinada nos termos do capital. É meio para o capital e, simultaneamente, como expressão de uma contradição, sujeito gerador e transformador do capital”. A semiformação é um impedimento para a formação do indivíduo, pois o adapta à realidade cultural vigente e capitalista da indústria cultural.
Em sua obra “Teoria da Semiformação”, Adorno analisa a crise da formação cultural decorrente das mudanças sociais: “A formação cultural agora se converte em uma semiformação socializada, na onipresença do espírito alienado que, segundo sua gênese e seu sentido, não antecede à formação cultural, mas a sucede”. (ADORNO, 2010:9). Desse modo, a semiformação cria, no indivíduo, uma falsa sensação de sabedoria, encobrindo a realidade de superficialidade na qual se encontra. Como avalia Pucci: “A semiformação, ao invés de instigar as pessoas a desenvolverem plenamente suas potencialidades, e assim colaborarem efetivamente na transformação social, propicia um verniz formativo que não dá condições de se ir além da superfície”. (PUCCI, 1997:3).
Adorno (2010), analisando a crise da formação cultural da época, chegou à conclusão de que “a única possibilidade de sobrevivência que restava à formação é a autorreflexão crítica sobre a semiformação em que necessariamente se converteu”. (ADORNO, 2010:39). A semiformação é um impeditivo para a formação porque adapta o indivíduo ao sistema capitalista, distanciando-o do saber emancipatório para ajustá-lo à cultura de mercado. Quando a produção simbólica, própria da cultura de um povo, é convertida em mercadoria pela indústria cultural, distancia-se do saber popular, desencadeando, então, o processo de semiformação.
Aqui, podemos estender esse preceito para a educação como uma máxima a ser seguida. Formar o indivíduo, por completo, em todas as suas dimensões, só será possível se compreendermos a Bildung adorniana como a capacidade de reflexão crítica para a maturidade, para a autonomia, em que a pessoa se torna capaz de agir por si mesma, sem estar sob o domínio de outrem, como dizia Kant.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Enxergar a realidade em que se vive e pensá-la criticamente são requisitos para a formação na escola. Caso contrário, ela promoverá a massificação do indivíduo que, aos poucos, vai perdendo sua identidade e subjetividade, se rendendo aos desígnios da indústria cultural e da ratio instrumentalizada. É preciso resgatar a dimensão de autonomia que fora contida pela adaptação dos conteúdos escolares aos interesses do mercado.
(...) a educação escolar, em todos os seus níveis, não pode se reduzir simplesmente à preparação do educando para se adaptar a mudanças constantes do mercado e aos interesses dos que ainda podem oferecer algumas vagas de trabalho. A educação escolar deve ser contemporânea de seu tempo e formar indivíduos aptos a enfrentar os desafios que o mundo globalizado impõe. E justamente por isso, o educando que não conseguir apreender o sentido formativo da educação escolar e o potencial formativo presente em todas as disciplinas, inclusive nas profissionais, dificilmente será um profissional competente e um cidadão preparado para os revezes do mercado. (PUCCI, 2005:24).
Não basta termos a tecnologia presente na Escola, precisamos saber o que fazer com ela. A Escola deve se abrir e entender que é um importante lugar de formação, e os professores precisam ajudar os alunos a serem seletivos, a saberem o que fazer com tanta informação que eles adquirem na internet.
A Escola precisa ensinar e os alunos para usar a tecnologia. Para isso, os professores necessitam estar preparados, já sabendo utilizar a tecnologia para ajudar os alunos a dar sentido às atividades tecnológicas, possibilitando-lhes a aprendizagem. A Internet traz uma gama de informações que o professor pode e deve utilizar com os alunos para que eles saibam o que está acontecendo no mundo em tempo real, que naveguem em hipertextos, em bibliotecas virtuais, pesquisem mapas, encontrem biografias de grandes autores, entrem em contato com os colegas para construírem, juntos, o aprendizado em chats, blogs e, até terem, enfim, argumentos para confrontar as ideias dos professores, questionando-as e contribuindo para a construção do conhecimento.
Esse processo suscita que educadores e gestores sejam, adequadamente, preparados para o uso correto e dinâmico das tecnologias na sala de aula, fazendo dessas ferramentas disponíveis um instrumento benéfico para a formação cultural (Bildung) dos alunos. Somente por meio do ato educativo emancipatório é que se pode criar uma consciência verdadeira. Cabe-nos, assim, refletir sobre o quanto essas práticas educativas possibilitam o desenvolvimento de experiências formativas que auxiliem o desenvolvimento da consciência crítica e reflexiva nos indivíduos.
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